Transmissão de dupla embreagem: erros e acertos

O câmbio de dupla embreagem evoluiu. Ele exige conhecimento técnico e ferramentas especificas para a manutenção e reparos.

O mercado automotivo ao redor do mundo está interconectado em muitos níveis, particularmente em termos de trens de força. Como a APTTA é uma instituição voltada para o desenvolvimento de técnicas de reparo em transmissões automáticas, nós estamos sempre monitorando as novidades neste mercado. Como resultado, uma transmissão em particular tem sido consistente em aparecer no topo das que mais aparecem na oficina de reparação ultimamente.

Essa transmissão é a famosa DQ200. Desde a Europa, passando pela Austrália, China e Brasil e mais, estas unidades estão cada vez mais presentes nas oficinas dos técnicos em todo o mundo.

Fabricada pela Skoda Auto, a produção da DQ200 iniciou em 2007 e permanece até hoje. Ela também é conhecida como 0AM, 0CW, DSG7 e algumas outras de nomes menos populares.

Existem mais de quatro milhões de unidades produzidas atualmente, e não parece que ela irá desaparecer em pouco tempo! Muitas atualizações nesta unidade e nos programas de software foram capazes de corrigir vários problemas em certas áreas da transmissão. Contudo, ela inevitavelmente apresenta outros problemas de tempos em tempos. Vamos examinar um pouco mais de perto esta unidade:

VISÃO GERAL DA DQ 200

Esta unidade é uma substituição direta da DQ250 de 6 velocidades, transmissão de dupla embreagem molhada. A DQ200 é uma transmissão de engates automáticos, de 7 velocidades, embreagem dupla seca que utiliza controles hidráulicos para operar os engates de marchas e os atuadores das embreagens. O conjunto de controle é chamado de conjunto mecatrônico e possui um cárter separado com bomba de óleo para operar os atuadores e solenoides. A caixa de engrenagens, assim como outras unidades DSG, e composta de duas transmissões manuais em uma carcaça simples. Existem dois eixos de entrada e dois eixos de saída, com um conjunto de engrenagens para as marchas ímpares e outro para as pares, com um reservatório de fluido comum. A embreagem dupla seca é anexada ao motor através de um volante de dupla massa.

Quando tudo trabalha corretamente, a transmissão atua maravilhosamente bem, com engates precisos e rápidos. Contudo, partidas repetidas com o veículo parado poderá causar algumas saídas não tão macias, o que é típico de unidades de embreagem seca.

APLICAÇÃO DO CÂMBIO DQ 200

A transmissão DQ200 é encontrada em veículos de vários fabricantes e modelos diferentes, muitos dos quais não são encontrados no Brasil. (Figura 1)

AUDISEATSKODAVOLKSWAGEN
A1LEONFABIAGOLF
A3ALTEAOCTAVIAJETTA
Q1IBIZARAPIDPOLO
TTTOLEDOSUPERBPASSAT
  YETIBEETLE
Figura 1

A transmissão DQ200 é encontrada em veículos com motorização entre 1,2 litros e 2,5 litros de cilindrada.

MECATRONICA
Figura 2

Figura 2. O conjunto mecatrónico possui um bujão de dreno Allen 5 mm. Um novo conjunto mecatrônico adquirido no concessionário já vem pré-abastecido. Sempre drene e abasteça pelo volume somente. O abastecimento pode ser feito pelo respiro da unidade mecatrônica ou pelo bujão Allen 5 mm no topo da mesma.

Fluido da mecatrônica: Número VW G 004 000 –    
Capacidade 1 litro
Fluido equivalente: TITAN Fuchs CHF 11S

TRANSMISSÃO
Figura 3

Figura 3. A transmissão possui um bujão de dreno Allen 10 mm debaixo da área do diferencial da unidade. O abastecimento pode ser feito pelo respiro da transmissão.
Fluido da Transmissão: Número VW G 052 171 – 75W
Capacidade 1,7 litros.

PRECAUÇÕES

Sempre utilize os fluidos recomendados pelo fabricante ao prestar serviços nesta unidade. A transmissão DQ200 possui dois reservatórios de fluido. Um para a transmissão em si, e outro para a unidade mecatrônica. Cada cárter é abastecido somente pela capacidade. Não possuem níveis. A unidade mecatrônica utiliza um fluido especial para conjuntos hidráulicos e caso haja algum vazamento, ela deverá ser esvaziada e depois, completada com fluido recomendado. Já a transmissão utiliza óleo para engrenagens 75W adequado para ela. Os anéis sincronizadores dentro da unidade são de latão revestidos de molibdênio, e necessitam um fluido de baixa viscosidade, para funcionarem corretamente.

Uma outra área para se trabalhar com cuidado é a unidade mecatrônica. Dentro dela existe um acumulador usado para manter um volume de óleo pressurizado, pronto a operar os atuadores e solenoides para as mudanças de marchas e acionamento das embreagens. (Figura 4)

Figura 4

Figura 4. Sob a cobertura do conjunto mecatrônico, existe um acumulador de alta pressão. Existem 7 porcas de fixação que não devem ser removidas quando se remover a mecatrônica do veículo, por razões de segurança. Note que, se o acumulador apresentar falha, podemos utilizar uma broca e furar através da tampa da unidade e a carcaça do acumulador para aliviar a pressão interna (gás inerte) e certificar-se que pode remover a tampa com segurança.

O acumulador é carregado com um gás inerte que age em um pistão em um dos lados, enquanto o óleo sob pressão é bombeado do outro lado. A pressão de óleo dentro do acumulador alcança entre 40 bar (580 psi) e 60 bar (870 psi), mas pode chegar até 70 bar (1.015 psi). Uma tampa resistente à explosão protege o acumulador. Contudo, a tampa deve ser removida para o serviço dos componentes da mecatrônica. Sempre utilize de extremo cuidado ao remover a tampa. Trate o conjunto como se o acumulador estivesse com defeito até posterior verificação. A força de descarga do acumulador pode machucar severamente ou mesmo matar o técnico sem cuidado!

OS PROBLEMAS

Várias reclamações funcionais e de dirigibilidade foram solucionadas nesta transmissão pela atualização dos programas do módulo TCM. Sempre procure pela última programação (mais recente) para se certificar que o módulo da transmissão está atualizado.

Programas relativos ao trem de força podem ocorrer dentro ou fora da transmissão. A DQ200 possui sua parcela de ambos. Assim sendo, é muito bom ter conhecimento do funcionamento de seus componentes que podem fazer o cliente levar o veículo à oficina. Alguns destes problemas mencionados são:

  • Veículo não se movimenta (emergência de neutro)
  • Sem marcha à Ré. Marchas à frente estão OK.
  • Vibração das embreagens, patinação e trepidações
  • Ruídos diversos

Quando o indicador de mudanças (P R N D S) no painel pisca, isto indica que existe uma falha anotada pelo TCM e/ou uma falha no modo de gerenciamento foi inicializada. Um indicador piscando pode ser acompanhado de vibração da embreagem ou falta de movimento, ou a unidade travando em uma determinada marcha somente. Falhas intermitentes tipicamente indicam que um problema mais sério está se apresentando. Infelizmente, apenas ler os códigos de falha e seguir o caminho de diagnóstico padrão nem sempre nos leva à causa raiz do problema. Deve-se estar ciente que esta unidade possui um padrão de falhas que ocorrem com bastante frequência.

O MATERIAL FUNDIDO DO CORPO DE VÁLVULAS

A falha mais comum na unidade DQ200 é apresentar trinca no material do corpo de válvulas, na região do acumulador (figura 5). Existe uma área que está sob extrema alta pressão e é feita de alumínio. Com o tempo, a carcaça trinca e começa a vazar. Nenhum sintoma de dirigibilidade é observado no começo. Assim, para se perceber uma falha em progresso, deve-se monitorar pelo escaner os dados do TCM. A simples leitura do interruptor de pressão da mecatrônica enquanto o veículo opera em marcha lenta na temperatura normal de trabalho, poderá revelar este problema.

Figura 5

Figura 5. O fundido do corpo de válvulas onde está a rosca do acumulador tende a trincar. Sempre inspecione esta área quanto a trincas e fadiga do material. Substitua ou repare conforme a necessidade.

Se a pressão cair para 40 bar sem nenhum componente em funcionamento, é possível saber que existem fugas de pressão. Note que os atuadores de embreagem e os garfos de seleção e engate podem vazar também, porém eles não causarão uma queda de pressão enquanto o motor estiver em marcha lenta e a transmissão em neutro ou Park (enquanto as embreagens estiverem abertas).

Existem opções de reparo do sistema mecatrônico sem substituir todo o conjunto. O corpo do acumulador está disponível em vários fornecedores, o que permiti um reparo decente do sistema. Contudo, algumas companhias produzem um acumulador modificado que utiliza a própria carcaça danificada do corpo, originando um reparo extremamente confiável. Contate seu distribuidor de peças para saber mais.

TCM

O TCM nesta unidade está localizado no corpo de válvulas e é parte integrante do conjunto mecatrônico. Seu arrefecimento é obtido pelo fluido que circula no sistema. As versões mais antigas da DQ200 utilizavam um fluido hidráulico corrosivo que reagia com os circuitos da placa do TCM. Causando falha prematura do mesmo. O fabricante recomendou então um novo tipo de fluido para solucionar este problema.

Mesmo com as atualizações, o TCM possui um grande percentual de falhas. O superaquecimento é o maior problema que causa sua falha. A fonte do superaquecimento ainda não está clara até que se examine mais de perto o que está acontecendo dentro desta unidade.

A trinca do corpo de válvulas que mencionamos alguns instantes atrás faz com que a bomba elétrica trabalhe mais do que o normal para atender à demanda de mais pressão causada pelo vazamento. O motor da bomba elétrica permanece ligado por muito mais tempo do que em condições normais, causando eventualmente que os circuito de alimentação da bomba fiquem sobrecarregados, se aqueçam e queimem. Um cliente pode operar seu veículo por um longo período com problemas intermitentes, o que leva o circuito do motor da bomba trabalhar demasiado por longo tempo e além da capacidade de projeto do TCM.

Outras áreas de preocupação existem na placa de circuitos e conectores. Juntas soldadas na placa do TCM frequentemente falham. Os circuitos da rede CAN e alimentação da bomba elétrica são os exemplos mais comuns de pontos de falha. Geralmente, como estes circuitos são muito delicados, a solução é substituir o TCM. O conector do TCM e o conector do chicote do veículo devem sempre ser verificados e reparados conforme necessário.

DURAÇÃO DAS EMBREAGENS

Estas unidades são aplicadas em motores de baixa cilindrada e podem durar um longo tempo com a correta manutenção. O conjunto das embreagens possui uma vida útil normal de aproximadamente 80.000 quilômetros ou mais. Veículos dirigidos na cidade ou sob uso severo podem ter vida mais curta das embreagens. Diferente das transmissões de discos simples, a substituição de um conjunto de embreagem dupla é bem mais cara. E a mão de obra para fazê-lo requer ferramentas e conhecimento especializado. É claro que os clientes pensarão duas vezes antes de reparar um veículo de dupla embreagem. Sempre mostre ao cliente os valores de reparo e substituição antes de executar o serviço.

Quando o conjunto de embreagem é instalado corretamente, ele trabalhará como novo. Remoção, instalação e ajuste das embreagens necessitam de ferramentas especiais. Alguns calços são usados para ajustar o curso livre das embreagens seguindo as publicações especializadas. Nunca realize um trabalho deste tipo sem as informações e ferramentas adequadas.

SEXTA MARCHA/FALHA DO GARFO DA MARCHA À RÉ

Uma reclamação de ausência da marcha Ré tem sido comum nestas unidades. Tudo pode trabalhar muito bem até que o câmbio não engate mais a Ré. Algumas vezes, isto pode ser intermitente. Mas na maioria das vezes, a marcha Ré não retorna, e um código de falha indicará um sensor (G490) relacionado à falha presente. Um teste drive do veículo mostrará que a sexta marcha também desapareceu.

O problema da ausência da sexta marcha e da marcha a Ré, é atribuída ao garfo da sexta/Ré. A área do problema reside nos rolamentos dos guias do trilho de mudança do garfo (Figura 6)

Figura 6. Conjunto do garfo da sexta marcha/marcha Ré atualizado possuindo retentores plásticos, reforçados para evitar futuras falhas.

Os retentores plásticos do trilho de mudança ressecam e quebram, fazendo com que o trilho de mudança corra fora de sua linha de ação quando trabalha. Frequentemente o trilho de mudança trava devido ao material quebrado do retentor plástico e a carga lateral imposta ao garfo de mudança trava o mesmo quando ele tenta executar o engate da marcha. Existem reparos no mercado informal para este problema, porém a remoção do material quebrado do retentor pode ser um problema desafiador.

RUIDOS METÁLICOS, PROBLEMAS COM O VOLANTE DE DUPLA MASSA

Ruídos metálicos durante a partida do veículo podem indicar um problema fora da transmissão. A DQ200 possui um volante de dupla massa. Quando o conjunto está operando corretamente, o volante absorve as vibrações vindas do motor e a operação da transmissão é suave. Muitas vezes, com o tempo, as molas que absorvem as vibrações se desgastam e permitem folgas que geram ruídos muito fortes, causando um barulho de cascavel durante a operação, principalmente nas partidas do motor. Em casos extremos, as molas se desgastam no lado do motor (figura 6) causando travamento do volante e condição de travamento da partida.

Figura 6

Quando as molas do volante de dupla massa começam a bater por desgaste, o excesso de folga faz com as molas se projetem para fora de seu alojamento e danificam o bloco do motor.

Sempre inspecione o volante do motor em um veículo equipado com a transmissão DQ200.

CONDIÇÕES DE MODO SEGURANÇA

É essencial estar a par de algumas estratégias de operação de segurança utilizadas para proteger a transmissão. Condição de segurança pode ser confundida com falha da transmissão. Em muitos casos, o TCM comanda as embreagens a abrirem (condição de neutro) o sensor que algum dado de sensores está conflitando ou faltando. Aqui listamos algumas condições onde isto acontece e o veículo não se move:

  • Posição faltando ou conflitando dos trilhos de engate
  • Temperatura da mecatrônica está muito alta
  • Temperatura calculada das embreagens muito alta
  • Pressão da unidade mecatrônica muito baixa (abaixo de 40 bar)

Existem outras condições que podem causar a paralisação do veículo, usualmente acompanhadas de códigos de falha (DTCs). A verificação com scanner de todos os módulos do veículo é necessária para se certificar os dados dos sensores de outros módulos estejam afetando o controle do TCM ou não.

Quando uma transmissão foi utilizada no “mundo real” por um tempo considerável, ela poderá revelar áreas mais sujeitas a defeitos que podem ser reparadas para que ela volte as condições ideais de trabalho. Frequentemente, os produtos à venda no mercado informal hoje ajudam a certificar que os reparos sobreviverão ao teste do tempo. Contudo, alguns componentes só permitem devolver as condições de funcionamento da transmissão até o padrão do fabricante. Conhecer as opções ajudam a entregar os serviços aos clientes com a garantia e promessa de que o trabalho será sempre o melhor possível!

Carlos Napoletano – Diretor Técnico da Aptta Brasil www.apttabrasil.com

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