Com mais espaço nas vias e agilidade no embarque, Monitor de Ônibus SP mostrou que o transporte público emitiu menos gases de efeito estufa e poluentes atmosféricos
Qual o impacto da pandemia no transporte público da cidade de São Paulo? Lançada no dia 22 de setembro, Dia Mundial Sem Carro, a nova ferramenta online Monitor de Ônibus SP, do Instituto de Energia e Meio Ambiente (IEMA), mostra que a velocidade média dos ônibus na cidade aumentou durante o isolamento social adotado devido à pandemia de coronavírus. A partir do mês de março, com a diminuição do número de pessoas e de veículos se deslocando por São Paulo, o transporte público pôde circular de modo mais eficiente, reduzindo 52% das emissões de dióxido de carbono (CO2), um dos causadores do aquecimento global, em um dia útil médio de abril quando comparado a um dia útil média de fevereiro. Empregando a mesma comparação, a emissão de material particulado (MP), formado por fuligem e outras partículas sólidas ou líquidas em suspensão na atmosfera que podem causar problemas cardiorrespiratórios, foi reduzida em 51%. Já os óxidos de nitrogênio (NOx), poluentes responsáveis por problemas pulmonares, tiveram suas emissões reduzidas em 56%.
O Monitor de Ônibus SP foi criado para auxiliar o acompanhamento das emissões de gases de efeito estufa (GEE) e de poluentes provenientes dos ônibus da cidade de São Paulo. Ele ajuda a verificar se as operadoras e o poder público vão conseguir reduzir pela metade as emissões de CO2 do transporte por ônibus paulistano; em 90%, as de MP; e em 80%, as de NOx até 2028, tendo como base o ano de 2016. Esses compromissos estão expressos na Lei Municipal 16.802 de 2018, que aborda a redução de emissões do transporte público na cidade. “O Monitor de Ônibus SP é uma ferramenta que processa os dados abertos da prefeitura e disponibiliza análises ágeis e acessíveis para a sociedade acompanhar o nível de oferta de transporte, a fluidez da operação e as emissões. Com isso, almejamos contribuir para termos em São Paulo um transporte público inclusivo, de qualidade e não poluente”, diz David Tsai, um dos seus idealizadores. Conheça a ferramenta: energiaeambiente.org.br/onibus-sp
Na pandemia, os ônibus passaram a circular mais rápido ao longo de todo o dia. Na primeira semana após o início oficial da quarentena em São Paulo, dia 24 de março, a velocidade média dos ônibus no horário de pico, entre sete e dez da manhã, chegou a 22 km/h. Esse número chegou a ser 15 km/h, valor 32% menor, no início do ano de 2020, ainda no período pré-pandemia. Recentemente, quando as pessoas começaram a voltar às ruas, mas sem que os níveis de circulação anteriores tenham se restabelecido, observa-se uma velocidade média de 19 km/h. “O material particulado emitido durante o mês de abril, auge do isolamento social em São Paulo, caiu 42% em relação ao total emitido em fevereiro”, conta Felipe Barcellos e Silva, pesquisador do IEMA. Isso ocorreu devido à redução de frota em circulação, mas também graças ao aumento da velocidade média dos ônibus que permaneceram rodando.
Sob uma velocidade maior, eles ficam menos tempo no trânsito e tornam-se mais eficientes, gerando menos emissão por quilômetro trafegado. Para cada quilômetro rodado em fevereiro pelos ônibus públicos, era emitido mais poluentes e GEE do que para cada quilômetro percorrido durante o isolamento social. A velocidade melhorou, principalmente, por dois motivos. Com menos carros nas ruas, os ônibus trafegaram com menor concorrência pelas vias. Pontos de parada menos lotados, com menor quantidade de passageiros entrando no veículo de uma só vez, também afetaram a velocidade média das viagens, pois os ônibus ficaram menos tempo parados para o embarque.
É interessante notar também que as concentrações de material particulado no ar medidos pela Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (CETESB), na primeira quinzena de abril na capital paulista, estiveram notavelmente abaixo das medições com relação aos três anos anteriores, conforme artigo publicado pelo IEMA em maio. A redução da atividade dos ônibus e o aumento da velocidade de circulação, junto com alterações no comportamento de outras fontes emissoras do poluente, pode ter contribuído para a breve melhoria da qualidade ambiental na cidade. Isso aponta para um fato já amplamente conhecido que é a importância de se investir na qualidade da mobilidade urbana como forma de reduzir a poluição do ar.
O aumento da velocidade é uma ótima notícia por si só. Leva os passageiros mais rapidamente para seus destinos, reduz as tensões do trabalho de motoristas e cobradores e ainda confere melhor previsibilidade ao serviço, facilitando a gestão da operação pelas empresas. Além disso, os motores de veículos operam de forma mais eficiente sob condições livres de circulação. O anda e para no trânsito travado desperdiça o combustível queimado. Portanto, maior velocidade é sinônimo de menor custo de operação, algo essencial para que se tenha modicidade tarifária, princípio para assegurar o direito ao transporte.
Redução da frota e estabilização de passageiros
O Monitor de Ônibus SP também mostrou que a partir do dia primeiro de abril houve uma redução brusca da frota de ônibus da cidade de São Paulo. “Essa decisão foi logo percebida como equivocada porque os ônibus ficaram mais lotados, colocando em risco a saúde dos passageiros, motoristas e cobradores”, lembra Silva. Após essa experiência, decidiu-se por voltar a aumentar a oferta de coletivos, mesmo com a média de passageiros diários 67% menor do que o normal. Hoje, a frota de ônibus em circulação nos dia úteis é de em média 12 mil veículos, enquanto esse número chegou a 13,8 mil no pré-pandemia e a apenas 6,8 mil no início dela.
Os dados também demonstram que a partir de abril até junho 237 milhões de passageiros utilizaram o transporte público. No mesmo período do ano passado, esse número foi de 674 milhões, valor quase três vezes maior que o atual. Isso mostra que mesmo durante o auge do isolamento social, uma quantidade importante de passageiros continuou usando o sistema de ônibus. Essa informação ressalta a importância do transporte público, alçado à categoria de direito social em 2015, conforme prevê o artigo 6º da Constituição Federal. Muitas pessoas não têm acesso a outros meios de locomoção, a não ser o ônibus. Assim, as cidades que proibiram a circulação de transporte público durante um período do isolamento social atingiram diretamente essa população que precisa desse meio de transporte, ferindo o seu direito à mobilidade.